domingo, 21 de novembro de 2010

XXVI – Sem Adeus

Tatá veio após o jantar, como eu não duvidei por um minuto. E no quarto, despejei nele tudo de uma vez. Desde o primeiro convite de Yuri, até a despedida organizada pelos amigos de Pedro. Para cada acontecimento Tatá tinha algo a dizer. Uma opinião, um conselho, uma bronca, ou apenas palavras de consolo. Ele é mesmo um amigo ímpar.


– Uau! – Exclamou. – Tudo isso no espaço de um mês!
– Mais ou menos isso... – Não era só ele que estava surpreso.


– Por isso que digo que você é Diva, Loira! Quem passaria por isso tudo sem ganhar um fio de cabelo branco ou uma ruga?

Eu ri. Ele era também absurdamente engraçado. Mas eu sabia o quanto aquilo tudo estava custando à minha saúde mental.


– Tatá, eu adoraria ficar aqui enumerando as minhas qualidades... Mas eu quero mesmo aproveitar um pouco mais do meu “irmãozão” antes dele viajar.

Meu semblante se fechou ao lembrar que só estaria com ele novamente na noite do dia seguinte, antes dele embarcar. Ninguém tiraria meu privilégio de levá-lo ao aeroporto.


– Veja o lado positivo disso, Léo. Você vai poder almoçar com o Yuri TDB e sua melhor amiga amanhã... Aliás... Você bem podia me chamar, heim? Só conheço a Nicole de vista e de ouvir você falar, queria tanto conhecê-la pessoalmente! Até a Guta já conhece!
– Vocês vão se dar muito bem, tenho certeza, Tatá! Mas noutra oportunidade talvez...


– Confessa que está com ciúmes, vai!
– Rá! Você é muito convencido, garoto!


– Eu nunca vou te trocar, Léo, eu juro! Você é minha Deusa-Loira-Linda-de-Morrer! Serei eternamente apaixonado por você...
– Ah, sim! Esqueci o exagerado... Convencido e exagerado! Eu também não sei o que seria de mim sem você.


Meu amigo me apertou e me deu um beijo estalado, depois se virou para ir embora. Eu não esperava aquilo de forma alguma.
– Ficou doido? O que deu em você?
– Só pra você me levar mais a sério... Tchau, Diva!


Tatá saiu e eu me aboletei no quarto de Pedro. Ele estava fazendo seus trabalhos e eu sabia que estava atrapalhando, mas não conseguia deixá-lo sabendo do pouco tempo que eu tinha.
– O que vai fazer com seu curso. Falta pouco pra você se formar não é?
– Devo trancar esse semestre. Depois, se eu me firmar em Desiderata, eu tento uma transferência. Mas pelo menos no início, enquanto estiver me adaptando, vou ter que abrir mão da Engenharia.


Eu sabia que para ele não estava sendo uma escolha fácil. Pedro sempre foi estudioso, desde menino, dizia Dora. Não fazia o tipo esportivo e quando chegou em casa com a novidade de pratica boxe pegou todos nós de surpresa.


Acabou entrando para o futebol por acaso, por insistência de David, que o vira jogar uma única vez, de brincadeira na areia da praia. Nunca havia pensado em ingressar no time da UFEB, menos ainda fazer parte de uma equipe profissional. Mas descobriu mais uma habilidade e acabou se encantando pelo esporte.


– Você conhece alguém na cidade? Vai ficar sozinho?

Ele deixou de lado o caderno e acariciou minha mão.
– Por enquanto sim. Vão pagar um apart-hotel, até eu me estabelecer.


– Apart-hotel?! – Exclamei. – Então eles não te conhecem? Não sabem que aquilo lá vai virar um abatedouro?
Pedro fez um sorriso malandro, mas não respondeu nada. Ele sabia que era verdade, e me deu raiva dele achar tão natural.


– Tá com fome? – Ele perguntou de repente.
– Nã-hã! – Gesticulei. – Se dependesse de você eu seria uma baleia.


– O que você quer fazer então?
– Nada... Só quero ficar aqui com você. Se quiser retomar seu trabalho eu prometo que fico quieta. – Respondi deitando minha cabeça em suas pernas.


– Você?! Quieta?! – Ele duvidou.
– Porque você me trata como se eu ainda tivesse 12 anos de idade, Pedro?


– Porque às vezes você se comporta como se ainda tivesse 12 anos de idade, Léo... – Ele disse sério, porém distraído com os cachos do meu cabelo.

Em uma situação normal, eu protestaria. E talvez até esperneasse como uma garotinha de fato. Mas havia um tempinho que eu não sabia o que era viver uma situação normal.


O telefone de Pedro tocou e ele se apressou para atender, obrigando-me também a me ajeitar.
– Alô...

Eu não fiz menção em me retirar. Se eu não pudesse escutar, ele que sinalizasse para eu sair.


– Errr... Oi... – Ele pareceu não pronunciar o nome da pessoa ao telefone de propósito. – Tudo bem, e você?

Ensaiei não ligar e tentei me distrair com alguma coisa pelo chão. Mas mantive meus ouvidos alertas.


“Sim, sim tá confirmado. Por volta de uma da tarde.”, “Não... Eu já disse que não, o que é que você esperava?”, “É...”, “Não! Você tá viajando!”

Eu ia escutando só a parte de Pedro no diálogo, e tentando encaixar as frases de modo que fizessem sentido, ou me levassem a descobrir quem poderia ser do outro lado da linha.


“Você entendeu, não é? Até amanhã!”

Pedro encerrou a ligação e olhou para mim. Eu deduzi que era Penélope ao telefone e percebi que ela estaria no tal churrasco amanhã. Claro que se eu fosse ela faria o mesmo, mas só conseguia a odiar mais por isso.


Eu me levantei.
– Vou pra cama, Pedro. Estou morta de sono.
– Hey, Léo. – Ele me segurou, antes que eu saísse. – Sobre a Penélope... Queria tanto ter o poder de controlar o tempo... Eu não deixaria acontecer de novo, mas sei que a culpa de tudo foi minha, por isso disse ontem que lamentava... Me desculpe.


Percebi algumas lágrimas rolarem do rosto de Pedro e ele baixou a cabeça na intenção de escondê-las. E então introduziu outro assunto, mas pelo visto não menos doloroso:
– Eu sou um ingrato! Qualquer cara que joga comigo daria tudo para estar no meu lugar agora... Porque eu não estou empolgado?


Aninhei meu irmão da maneira que minha altura me permitia.
– Porque você ainda não ouviu um estádio inteiro gritando o seu nome. Você vai ser brilhante, Pedro. Eu sei que vai!

Dei-lhe a visão superficial que combinava comigo, mas talvez eu soubesse a verdadeira razão. Assim como ele com certeza sabia.


A primeira pessoa que vi foi Nicole. Na verdade, eu só vi a Nicole. Estava com tanta saudade da minha amiga que me atirei em cima dela. Nem parecia que estivemos juntas há poucas semanas.
– Nick! É uma droga você estudar tão longe! Não sabe a falta que você me faz!


– Larga de frescura que eu sei muito bem que você tem amigos maravilhosos! – Ela replicou. – Principalmente o tal do Tadeu...

A forma como ela falou não me deixou dúvidas de que ela havia conversado com Yuri sobre mim.


E foi exatamente meu professor quem resolveu chamar a atenção para si, já que eu nem tinha reparado sua presença ali.
– Olá pra você também, Léo! Conhece a tia Débora, não é?
– Claro que conheço, engraçadinho! Só não posso dizer que a mais tempo do que você!
Eu o chamei de engraçadinho?!


Era estranho que eu conseguisse me sentir muito mais a vontade com Yuri na presença de Nicole e tia Débora. Não deveria ser o contrário? Nunca havia sido tão articulada ao lado dele como fui durante todo o almoço.


A outra surpresa agradável ficou por conta da relação entre os primos. Apesar dos quase oito anos que separavam os dois, Nicole e Yuri pareciam ter a mesma idade. Talvez por Nicole ser tão madura, e por Yuri ter um espírito tão jovem. O entrosamento ali era enorme, pareciam irmãos.


Não posso dizer que não foi divertido ouvir tia Débora ralhar com Yuri. Mais engraçado ainda, ele se encolher a o ouvir sua bronca e acatar sua ordem imediatamente. Afinal, aquele era meu professor universitário!


Não se falou de Sônia à mesa, apenas de Ariel. Yuri também não mencionou nada a respeito do flagrante que sua sogra nos deu, ou do que aconteceu quando voltou para casa. Eu estava curiosa, mas grata pelo assunto não vir à tona. Pelo menos não na frente de tia Débora.


Só lamentei mesmo não ter um tempo com minha amiga a sós. Havia tanto assunto para por em dia e nada pôde ser dito. Tudo se aliviou quando ela se despediu.
– Sei que Pedro está partindo. Quer que eu passe o domingo com você?

Era muito mais do que eu podia desejar.


Quando abri a porta de casa, dei de cara com a mala de Pedro na sala, mas ele ainda não havia chegado. Era uma bagagem de mão pequena, afinal ficaria fora apenas 2 dias. A tristeza me bateu junto com a inveja, novamente, ao imaginar meu irmão se divertindo nos braços da Luli ou da Penélope. Faltavam poucas horas agora, e eu o queria aqui.


Fui para o meu quarto e tirei minha roupa com a intenção de entrar no banho, mas ao me deparar com quadro de cortiça na parede, vi o cartão de Nuno e achei que seria um bom momento para ligar. Se ele havia deixado o cartão, talvez eu tivesse chances de me retratar.


Enrolei-me numa toalha antes de discar.
– Alô. – Ouvi a voz grossa e rouca do outro lado, isso conseguia deixá-lo ainda mais sedutor.
– Nuno? É a Léo... Tudo bem?


Não houve resposta durante alguns segundos e eu quase desliguei.
– Oi, Léo... Eu não esperava receber um telefonema seu, eu... Nem sei o que dizer...
– Tudo bem, não precisa, não achei que esperasse, também... – Era tudo tão constrangedor que as palavras saíam com uma incrível dificuldade. – Eu apenas queria pedir desculpas, por toda aquela cena, a falta de educação do meu irmão, e a maneira como você saiu...


– Espera! – Ele me interrompeu. – Aquele era seu irmão?!
Pude imaginar seu espanto, é claro, pela parte da história e a forma como ouviu.
– É... – Respondi simplesmente.
Eu tinha ligado para me desculpar e não para dar satisfações, mas de repente percebi que não haveria como me livrar de uma explicação, por mais simples que ela fosse.


– Desculpe se estou surpreso... Não parecia uma discussão entre irmãos, mas claro que entendi tudo errado.
– Bom, ele é meu irmão de criação, na verdade... Não que isso faça alguma diferença...


– Léo... Perdoe a minha sinceridade, mas faz toda a diferença. De qualquer forma, não estou em posição de avaliar isso, além do mais estou muito contente de escutar sua voz, para pensar noutra coisa.

Foi a minha vez de ficar muda. Nunca imaginaria ter causado tão boa impressão numa única noite, especialmente naquela. Acreditava que Nuno estava apenas querendo ser gentil na manhã seguinte.


A porta do meu quarto se abriu. Era Pedro chegando do churrasco e notei que ele havia exagerado na bebida. Não posso nem dizer que não esperava por isso.
– Léo! – Ele berrou sem necessidade. – Acho que tô atrasado! – E abriu um sorriso bobo.


Do outro lado da linha, Nuno deve ter escutado, e me ajudou:
– Olha, Léo... Você está com meu cartão. Sinta-se a vontade para me ligar quando quiser, tá bem?

Eu me perguntei em que momento eu fiz por merecer ser tão bem tratada.


Despedi-me de Nuno completamente sem jeito e constatei ao desligar que estávamos mesmo apertados no horário.
– Entra no banho rápido, Pedro... Tenho medo que não te deixem embarcar assim.
– Que frescura, Léo!


– Prefere mesmo arriscar perder o voo?
A minha pergunta pareceu fazê-lo cair na real. Eu o levei até o banheiro, ajudei-o a se despir, e o joguei embaixo do chuveiro. Foi então que notei que eu ainda estava só de toalha.


Voltei para o meu quarto e apenas vesti uma roupa, deixaria meu banho para quando retornasse. Senti raiva de Pedro me obrigar a sair de qualquer jeito. Inferno!


Meu pai estava de plantão aquela noite e Dora alegou não querer passar por isso duas vezes. Portanto éramos somente eu e Pedro, durante o crepúsculo, a caminho do aeroporto.
– Está melhor? – Perguntei descompromissadamente e sem tirar os olhos da direção.


Ele demorou muito tempo, mas acabou respondendo:
– Me explica como posso estar melhor... – Ele inspirou antes de concluir, resoluto. – Eu não quero ir!
– Não diga besteira, é claro que você quer! – Rebati de imediato.


Pura presença de espírito, porque na verdade pensei que minha cabeça fosse explodir com a quantidade de perguntas que haviam se formado diante da afirmação do meu irmão. Mas a pior delas, aquela que eu não queria pensar, era o que poderia ter acontecido naquela tarde, para ele demonstrar tanta certeza ao pronunciar.


Havia um recado do meu pai na secretária eletrônica quando cheguei. Ele queria se certificar que seria seguro eu morar sozinha. Achei graça. O que ele iria fazer? Contratar um guarda-costas?


Após um longo e relaxante banho, peguei minhas mensagens no celular. Uma de Tatá pedindo notícias, claro. Outra de Nicole confirmando sua presença no domingo e a terceira cujo número não constava na minha agenda, fazendo-me ler apressadamente para ver se havia assinatura:
“Tomei a liberdade de salvar seu número na agenda do meu telefone. Espero que não se oponha. Bj, Nuno.”


Respondi apenas essa.
“Então farei o mesmo, não quero ficar em desvantagem. Bj, Léo.”

Apertei o “send” e esperei. Estava parecendo uma pré-adolescente, aguardando ansiosa ser chamada para um baile.


Não demorou mais que meio minuto para que eu recebesse a resposta.
“Ganhei minha noite, Léo. Durma bem.”
Sorri idiotamente para o iphone. Como se ele pudesse ver do outro lado...


Coincidentemente, mas não por culpa de Nuno, eu não consegui dormir. O velho pesadelo, aquele do qual nunca lembrava o conteúdo, o que há muito não vinha me assombrar, apareceu no meu sono, como um mau presságio.


Tomei um comprimido junto com um copo d’água e liguei a TV da sala. Torci para que tivesse algum filme monótono, que acelerasse o efeito do tranquilizante. Dito e feito. Acabei adormecendo no sofá.


– Sono pesado, heim, garotona?!

Eu ouvi a voz da Nicole, mas demorei a assimilar que ela estava ali ao meu lado. Tentei entender o que eu estava fazendo na sala.


– Bendita hora que você me deu a chave da sua casa! Estava errada achando que não era necessário! Você me deu um susto, Léo! Liguei, bati na porta, toquei a campainha! Tive medo do que ia encontrar!


Eu ainda estava tentando despertar. Eu não me achava depressiva a esse ponto, mas a preocupação de Nicole me fez refletir como eu sempre me mostrei ser tão indefesa.
– Desculpa, Nick! Tomei um diazepan e apaguei! Sabe que normalmente tenho o sono leve...


– Porque está tomando remédios pra dormir?! – Era mais uma bronca do que uma pergunta.
– Eu não “estou tomando”... – Frisei. – Eu tive um pesadelo ontem...


– Pesadelo?! Que pesadelo?
Eu precisava de um café.
– Aquele mesmo de quando eu era criança... O que eu nunca consigo me lembrar, apesar de acordar praticamente sem conseguir respirar.


– Mas você não me falou que eles tinham voltado!
– Eu espero que não tenham mesmo, Nick! Não quero passar por isso de novo... Quer um expresso?


– Deixa que faço pra você...
Devia ser pura gentileza de minha amiga, mas eu estava irritada com esse excesso de cuidados ao meu redor.


– Pelo amor de Deus! É uma cafeteira expressa elétrica, se eu não souber lidar com ela é melhor eu cortar meus pulsos!
– Hey! Calma aí, senhorita! Eu não te acho nenhuma boçal, e você devia saber disso!


Suspirei.
– Desculpa a grosseria... Mas é que todo mundo está me tratando como se eu fosse de quebrar ou algo assim...
– Bom, Léo... A verdade é que sempre te trataram assim, a diferença é que você costumava gostar disso.


Parei diante da máquina de café. Era horrível admitir para mim mesma que Nicole tinha razão. Mas o que havia mudado afinal?
– Tem certeza que não quer ajuda aí? – Ela perguntou diante da minha inércia.


Eu voltei minha atenção para cafeteira determinada a preparar um expresso suficientemente forte para me fazer acordar.
– Não, não... Eu só... Preciso de alguns minutos para acordar.


Enquanto saboreávamos o café, Nicole olhava pra mim com uma curiosidade inquieta.
– O que é, Nick? Pergunte logo!
– Ah, amiga! Desculpa! Sei que você está em alguma fase “eu sei ser independente”, mas não consigo não ficar preocupada!


– Eu... Preciso saber não é? De uma forma ou de outra... Pedro não ia poder cuidar de mim pra sempre...
Eu me lembrei das palavras de Tatá. Apesar de ignorar por completo o assunto “Pedro”, ele havia falado tão sabiamente!
– Tem certeza?


– Obrigada pelo apoio, Nick. Por acreditar na minha capacidade e potencial! Agradeço por estar aqui comigo!
– Não é de você que estou falando, Léo!


Eu fiquei confusa. Não era por isso que minha amiga tinha se despencado hoje para UFEB?
– Eu não estou te entendendo, Nicole!
– Isso, é por que você não QUER me entender, Léo!


Tentei encontrar a bolinha de cristal que deve existir no subconsciente de cada ser vivente, para decifrar as palavras de Nicole. Eu devia ter perdido quase um minuto nessa busca quando ela perdeu a paciência e concluiu:
– E se o Pedro estiver realmente disposto a cuidar de você pra sempre, Léo? Você já parou para pensar nisso?


Eu me levantei, exaltada.
– Você está viajando, Nicole! Porque Pedro iria querer isso? Qualquer hora dessas, ele vai encontrar a “Maria Chuteira” dele. Além do mais, ele estará em outro estado.
Nicole olhava descrente para mim.
– Ah, Léo! Deixa pra lá! Eu não tenho mesmo que me meter! Afinal, é da conta do Pedro, não é?


Eu não sabia exatamente do que Nicole estava falando. Ou talvez eu soubesse, mas não quisesse enxergar.
– Infelizmente é da conta dele! Quisera eu poder escolher a mulher perfeita pro meu irmão...
– Ah, é? – Nicole perguntou com certo deboche, e eu não entendi. – E como ela seria?


– Não sei, Nick... É tão difícil pra mim, aceitar qualquer mulher com o ele, mas... Hey! Se você não fosse namorada do Neto...
Nicole não me deixou terminar.
– Cala a boca, Léo! Como você pode ser tão cega?!


Não imaginei deixar minha amiga aborrecida com o comentário, era evidente que se tratava de uma brincadeira, pois sabia o quanto Nicole era apaixonada pelo seu “goleiro”. Ainda assim, minha mente doentia cogitou que talvez nem Nicole fosse boa o suficiente para Pedro.


Decidimos sair para espairecer. Eu sugeri compras, meu passatempo favorito, mas Nicole tinha planos de conversar e achava que acabaríamos nos desviando do , então optamos pelo Spa. Reservamos a sauna só para a gente no final da manhã.


– Verdade que pretende trancar a matéria do Yuri? – Nicole soltou do nada.
– Ah ele te contou tudo ou só a metade? – Perguntei com ironia.


– Não faz a menor diferença, Léo!
– Claro que faz! Você sabe o que estão dizendo? Tem alguma idéia da mente... Mesquinha de algumas pessoas?! E não tô fazendo só por mim... Yuri é casado! E tem uma filha tão doce que... Ah! Eu não posso pensar em estar no meio disso, Nick! Você me conhece! Sabe o valor que dou pra família!


– Mas ele mesmo disse que não se importa com o que dizem! É fofoca! Não vale nada!
– Seu primo é maluco! Ou doente! Ou os dois! – Exasperei-me ao responder enquanto me levantava. – Está muito quente aqui, não estou aguentando! Preciso sair.


Nicole saiu atrás de mim, e entramos no chuveiro.
– Você que exagera... Que falem, e daí?
– Desculpa se te decepciono por não ser tão desencanada, Nick!

Eu amo a minha amiga, não canso de dizer, mas quando ela me pressionava desse jeito eu tinha vontade de deixá-la falando sozinha.


– Você não me decepciona, Léo! Tá se tolhendo, não vê?!
– Nick... Ele te contou o que aconteceu na sexta feira? Eu não devia nem ter ido a almoço nenhum, mas estava morta de saudades de você...


– Sim, ele contou, mas vocês não estavam fazendo nada demais, então a Edna que pegue os chiliques dela e enfie naquele lugar!

Eu só tinha visto Nick falar com tanta raiva de alguém quando estávamos ainda no colegial, sobre uma guria infeliz que se dizia engajada e chamou nosso grupo de “bando de pattys fúteis”, durante uma feira de ciências sociais.


Ao mesmo tempo essa afirmação me fez crer que ela sabia mais sobre a vida do Yuri do que eu supunha, o que me colocava num dilema. Eu queria muito matar minha curiosidade, e sei que minha amiga não negaria me responder. Mas além de me parecer errado, eu não sabia como Nicole encararia esse meu interesse. Eu sei que ficaria magoada se Yuri fosse perguntar qualquer coisa de mim para Nick... Mas tinha quase certeza que ele perguntava!


Fechei o chuveiro e perguntei antes que minha coragem fugisse novamente:
– Nick... O casamento de Yuri não vai bem?
O rosto de minha amiga se fechou em tristeza.
– Olha, Léo... Por incrível que pareça, até comigo Yuri evita o assunto Sônia...


Repetindo meu gesto, Nicole também encerrou sua ducha.
– E eu não toco no assunto, porque sei que ele não se sente bem. O fato é que Sônia raramente está com ele, ou participa de seus programas, reuniões de amigos e família. Edna não colabora nem um pouco... Mas não posso acusá-la de nada, embora acredite piamente que sem ela talvez as coisas fossem mais fáceis.


Convencida de que eu só teria as respostas da boca do próprio Yuri, concluí:
– Bom, de alguma forma eles devem acreditar que há esperanças, não é? Do contrário, por que ainda estariam juntos?
– Porque as coisas nem sempre são tão simples como parecem...


Desde que Pedro falara algo parecido para mim pela primeira vez, essa máxima parecia me perseguir, qualquer que fosse a situação. Vestimos nossas roupas de banho, nos enrolamos em toalhas e partimos para um banho termal – uma piscina natural de pedras, com água mineral altamente aquecida – enquanto Nicole continuava a contar um pedaço da história do meu professor.


– Já te falei da parte da minha família que eu abomino, não já? – Eu apenas concordei com um aceno de cabeça. – Então... Tio Ernesto, que é pai do Yuri e irmão da minha mãe é o pior deles! Veja... Eles me amam muito e eu sempre vou amá-los, mas isso não quer dizer que eu aprove todos os seus métodos.


– Tio Ernesto sempre foi muito rígido com Yuri. Criticava tudo que meu primo fazia, nada nunca estava bom. Não importa que Yuri fosse o primeiro aluno da turma, ele tinha que ser o melhor do colégio. E se fosse do colégio, teria que ser da cidade, Yuri nunca estava à altura do que ele almejava e quando disse ao titio que queria ser professor, foi como se tivesse o apunhalado pelas costas.


– Mas que mal há nisso? – Perguntei assustada. Afinal, minha família também era tradicional, mas meu pai nunca reclamaria se eu quisesse lecionar. Pelo contrário, talvez fosse outra profissão que o deixaria orgulhoso.
– Tio Ernesto acha que é uma profissão inferior, por ser mal remunerada.


– Mas isso é uma questão cultural! Me admira muito seu tio ser tão ignorante! Em alguns países os professores são muito valorizados.
– Você acha que ele não sabe? E daí? Ele prega que se vivemos aqui, é sob essa ótica que temos que nos mirar... Enfim, eu disse! São coisas que de fato não gosto na minha família.


– Mas tia Débora não é assim... – Pelo menos essa nunca foi a minha visão da mãe de Nicole.
– Não, não é, mas Deus sabe o que mamãe também teve que enfrentar por sua independência! Você sabe, não sei quem é meu pai, e pelo visto, nunca vou saber... Porque minha mãe também não faz a mínima idéia de quem seja.


Se Nicole um dia não tivesse me confidenciado, eu, que conhecia tia Débora há aproximadamente oito anos, nunca imaginaria que aquela mulher estilo “perua-fashion”, engravidou de Nicole em uma festa “rave”, e que ela pouco se lembrava daquelas horas intermináveis de sexo, álcool, drogas e música eletrônica.


– Isso não incomoda mais você?
– Ah, Léo... Você lembra, não é? Quando éramos crianças e eu ficava inventando planos mirabolantes que me levassem a descobrir a “identidade secreta” do meu pai... Mas a gente cresce e descobre que super-heróis não existem. Então eu posso te responder que não... Desde que minha mãe me contou a verdade, eu percebi que nunca precisei dele mesmo.


Não consigo nem imaginar como deve ter sido para tia Débora enfrentar a maternidade desta forma. Embora seus avós nunca deixassem faltar recursos, sempre procuraram camuflar a realidade, conversas sobre o assunto eram proibidas na família.


Levamos os vinte minutos restantes do nosso banho escaldante em silêncio. Nicole apenas parecia desejar que sua mente fosse lavada tanto quanto seu corpo estava sendo agora. E eu tentava enxergar Yuri sob a nova ótica que sua prima havia me apresentado. Algumas coisas ficaram mais claras para mim, entretanto a pergunta principal continuava sem resposta.


Após o banho passamos à sala de massagem e durante o tratamento não pudemos retomar nossa conversa. Eu estava aflita para distrair Nicole com outro assunto.
– Relaxa, diva! Desse jeito, tô aqui suando a camisa à toa! – Disse Luana, a minha massoterapeuta preferida do Spa.
– Desculpa, Luana. Tive uma semana difícil...


Embora fosse difícil um diálogo, de onde estava, Nicole podia ouvir o que falávamos.
– Soca ela, Luana! Quem sabe assim essa menina toma jeito!
Eu fingi que não ouvi.
– Cruzes! Essa pele branca tão lisinha e macia... Sem manchas... É um pecado, Nick! – Respondeu Luana.


A tarde já ia ao meio quando decidimos almoçar no restaurante da piscina. Eu não sentia fome, mas Nicole pediu costeletas que tranquilamente serviriam para duas pessoas, mesmo assim ela comeu sozinha.
– Você está grávida? – Perguntei assustada, depois que o garçom retirou os pratos.
– Claro que não, tá maluca?!


Ela então mudou de expressão:
– Neto gosta de mulheres cheinhas...
– Maluca é você pelo visto! Quer ficar gorda porque o Neto é tarado?!


– Amiga, eu te amo, mas você às vezes é tão infantil!
– Nick! Você está fazendo Moda na faculdade! Você não pode ser gorda! Além do mais... O Neto te ama... Você poderia até ser faquir... Não faria a menor diferença pra ele!


Nicole pareceu parar para refletir.
– Você acha mesmo? Que ele me ama tanto assim?

Era estranho ver a amiga que sempre admirei pela estabilidade, entre tantas outras coisas, tão insegura ao falar de seu afeto, quando este fazia questão de demonstrar seu amor o tempo todo, em gestos e declarações.


– Duvido que ele ache qualquer “pin-up” mais bonita que você... Mas nem acredito que se resuma a isso... Eu estive com ele essa semana e quando ele falou do “findi” de vocês... Eu senti até inveja...
– Jura?! O que foi que ele falou?


Eu contei sobre nosso breve encontro na porta do Bumper e Nicole corou.
– Meu goleiro é um fofo, não é? Bendita hora que aceitei seu convite para assistir àquela bendita partida de futebol.


Eu relembrava cada cena que Nicole narrava.
– Nunca vou esquecer... Você usou seu charme para burlar a segurança e David ficou furioso quando te viu na porta do vestiário masculino... A maioria dos caras despidos – Nicole riu. – Pedro deu um sorriso malandro e o ruivo ao lado dele o cutucou apontando para mim.


– Verdade que a primeira coisa que reparei foi no bumbum... Mas assim que nossos olhares se cruzaram, eu senti... Uma coisa... Não sei explicar!
– Dor de barriga! – Impliquei. Nunca acreditei em amor a primeira vista.


– Ah, pára Léo! É verdade... Ali, onde ele parecia tão vulnerável, afinal era ele quem estava nu... Naquele momento, eu soube que seria dele.

Tudo muito bonito e tocante, mas não era para mim.


Chegamos de volta em casa junto com o anoitecer.
– Poxa, amiga... Eu vim te dar uma um força e passamos o dia todo falando de mim... Desculpa... – Pediu Nicole quando entramos. – Nem perguntei sobre o Pedro...


– Ah, Nick... Tudo bem... – Sinceramente eu achei melhor assim. Por fim, acabou me distraindo, eu não queria me lembrar como havia sido duro para mim deixá-lo embarcar naquele avião. Mas quando Nicole pronunciou o nome de meu irmão, eu me dei conta de que não tive notícias dele desde então. – Por falar nisso...


Peguei o iphone para ligar e notei que havia duas mensagens. A mais recente de Tatá perguntando como foi meu dia, a mais antiga era de Pedro, e havia sido mandado de manhã, avisando que havia chegado bem, estaria o dia inteiro treinando, e me ligaria à noite do hotel. Fiquei aliviada dele não ter ficado esperando uma ligação minha.


– É dele? – Nicole perguntou.
– É... Ele vai me ligar... – Sorri.


– Eu estive pensando... Porque você não chama seu amigo Tadeu para morar com você? Ele parece ser uma ótima companhia.
– Ah, Nick! Seria perfeito... Mas não sei se ele aceitaria e depois, seria injusto com as meninas. Se bem que, pra ser sincera não me importaria com a Augusta...


– Credo Léo, que maldade!
– Ah, não me importo mesmo, ué! Mas a Gê... Bem, tenho pena de deixar ela sozinha com a idiotinha.


– Converse com ele, e talvez com a Geórgia, quem sabe não é nenhum trauma pra ninguém?
– Vou pensar nisso, amiga...


– Bom, eu preciso ir... Não quero chegar tarde porque tenho aula muito cedo amanhã... Aliás, a senhorita também! – Nicole e sua mania! Eu suspirei. – Léo, por favor, esquece essa bobagem de trancar matéria... Ninguém vai mandar o Yuri embora se não há o que se provar! Pára de arrumar desculpa pros seus desapegos! Se for pra trancar alguma coisa, tranque o curso, e descubra do que você gosta!


– É melhor você ir embora mesmo, Nick! Amei o dia de hoje e não quero estragá-lo brigando com você! – Retruquei mal humorada.
– Faça o seguinte... Amanhã, depois da aula, pergunte ao meu primo sobre o Pôr do Sol...


– O quê?! – Eu fiquei confusa. – o que é que tem o pôr do sol?
– Apenas pergunte! – Ela exclamou, me dando um beijo na bochecha para se despedir.


Tive uma visão quando Nicole abriu a porta. Nuno estava parado na entrada, encostado numa motocicleta, e sorriu ao me ver.
– Olá, gata! Tentei me controlar, mas não resisti à tentação de te ver de novo! Quer dar uma volta?


Eu engasguei. Nicole deu uma risada maliciosa e exclamou:
– Uau!

Só naquele momento Nuno percebeu que eu não estava sozinha.


Ele se aproximou e tentou se desculpar.
– Mil perdões! Eu não devia ter vindo sem avisar! Não sabia que Léo estava com visitas...
– Ah, não por isso, err... Como é o seu nome?


– Nuno! Me chamo Nuno... – Apresentou-se.
– Então, Nuno... Eu sou a Nicole, amiga da Léo... Mas já estava mesmo indo embora...


Nick caminhou em direção ao seu carro. Mas de repente parou e deu meia-volta.
– Ah, só uma coisa... Não traga ela de volta muito tarde, ela tem uma aula importante amanhã!
Eu que estava muda até então, me pronunciei:
– TCHAU, Nicole!


Nuno sorria para mim enquanto Nicole entrava no carro e partia. Eu ainda estava assimilando a cena e considerando a proposta. Devia estar com cara de boba.
– E aí? Se estiver tarde, podemos marcar outro dia...


– Ah, não... Não considere tudo que Nicole diz... Ela pensa que é minha mãe, só porque é alguns meses mais velha. Mas...
– Mas? – Ele parecia tentar decifrar qualquer coisa que meu olhar pudesse lhe entregar.


– Acho que se meu pai souber que aceitei carona de estranhos, ele enfarta... Ou me deserda.
– Não somos tão estranhos assim, não é? E ele não precisa saber, pelo menos não agora... Só quando ele se tornar meu sogro... – Brincou. – Aí eu terei que dizer a verdade. Que sou um cabeludo, motoqueiro e... Professor de dança... Ele vai ficar muito decepcionado?


– Meu pai não é preconceituoso... Apenas preocupado demais! – Sorri, aceitando o seu cortejo.
– Eu não vou te pressionar. Sou paciente, posso esperar... Eu volto outro dia, gata!


Nuno se preparou para montar na motocicleta e partir.
– Espera! – Pedi. – Acho que você já me convenceu. Eu só preciso colocar uma calça, e uma jaqueta...
– Estou aqui te aguardando...


Quando eu retornei, Nuno já estava sentado no veículo em posição de partida.
– Ponha o capacete. – Ele ordenou antes d’eu pular na sua garupa.


Prendi meu cabelo por dentro, para não ficar cheio de nós. Não fomos muito longe. Mas foi uma viagem prazerosa. Nuno pilotava com tranquilidade, a brisa batia levemente em meu rosto. Não imprimiu velocidade hora alguma, provavelmente por receio de me assustar, mal sabia ele, que talvez apenas me excitasse.


Paramos em uma praça. E nos acomodamos em um dos bancos.
– Viu? Não sou tão perigoso assim... Não te levei a nenhum buraco sinistro...
– É... Você foi bonzinho... – Brinquei. – Nem acelerou pra me meter medo...


– Ah, é? Gosta de velocidade, gata? Tudo bem! Voltaremos com mais emoção, então! – Ele sugeriu com malícia, e eu tremi.
Mas meu tremor nada tinha de medo ou vergonha.
– Nossa! É impressão minha ou está frio aqui?


Ele me puxou e me envolveu.
– Vê se melhora assim...
No abraço senti sua pele morna, apesar da temperatura externa, e relaxei.


– Você é tão... Quente...
Ele sorriu e me encarou. Então me puxou para ainda mais perto e pressenti que se preparava para me beijar. Eu estava receptiva. Afinal, porque não? Mas antes de nossos lábios se unirem ouvimos um toque eletrônico e o iphone no bolso do meu jeans vibrou.


Eu nem raciocinei. Automaticamente me desvencilhei de Nuno e corri para atender antes da mensagem da operadora. Eu sabia, eu tinha certeza que era meu irmão.
– Alô, Pedro? Como você está?


– Oi, Léo! Tudo bem, a viagem foi “tranks”, mas fui pro campo direto hoje de manhã, desculpe por não ligar, não queria te acordar... Então mandei um torpedo antes de sair e desliguei o celular. Você recebeu, não recebeu?
– Recebi sim... Então... O que mais você fez? Deu uma volta na cidade? É legal, grande, bonita?


– Não... Não mesmo... Treinei o dia inteiro para o teste... Agora vou tomar um banho e dormir para estar descansado amanhã.
– Não se preocupe, porque eu sei que você vai conseguir, Pedro. Você é perfeito em tudo que faz!


– Você é uma irmã coruja! – Brincou. – Olha, independentemente de resultado, eu embarco de volta amanhã antes do almoço. Mas jure que não vai faltar aula pra me esperar, Dona Léo!
– Eu juro! – Era uma promessa vazia. Eu sabia que não conseguiria cumpri-la.


– Até amanhã, Léo... – Despediu-se.
– Até, Pedro... – Suspirei.


Quando me lembrei de Nuno, ele já estava de pé, e me encarava com um olhar confuso. Eu tentei me justificar, mas gaguejava ao dizer:
– Err... Era o meu irmão... Ele... Ele... Ele está viajando e... Volta amanhã...


Nuno adquiriu uma expressão séria, porém simpática ao responder:
– Vamos, não quero que perca aula. Vou te levar pra casa.


– Pedroooooooooooooo! – Eu já estava pendurada em seu colo, enquanto ele largava as malas para me amparar, assim que abriu a porta de casa.
– Eu avisei pra você não me esperar, Léo! Não acredito que você faltou aula!


– Sério que é isso que você tem pra me dizer?! – Perguntei ao me desempoleirar de seu pescoço. – Eu te liguei a manhã inteira! Desesperada pra saber do resultado do teste, pra saber do horário do seu voo. Só na caixa postal... Eu queria te pegar no aeroporto, que droga!
– Porque é que você não me escuta?


– Pare de me torturar, Pedro! Conte! Como é que foi? Quando assina o contrato?

Eu havia passado a noite inteira ensaiando esta euforia numa encenação. E até que ela me pareceu perfeita quando a executei.


Pedro não teve coragem de me encarar quando respondeu, engasgando:
– Eu... Não passei...
– O quê?! – Exclamei perplexa. – Mentira!


Fiquei paralisada por alguns segundos. Era uma reação automática por não compreender como alguém poderia ter reprovado meu irmão, no que quer que ele fosse testado. Pedro devia estar frustrado e decepcionado consigo mesmo. Ao mesmo tempo, era confortável para mim, acreditar que ele não tivesse mesmo passado. A euforia tomava conta de mim, mas eu não podia gritar de alegria.


Envolvi meu irmão com toda minha força, e meus braços encontram resistência em seus músculos retraídos. Pedro voltaria para nossa casa, voltaria para mim.
– Eles não têm visão. Você é o melhor! Vai ser sempre o melhor! – Ele sabia que eram palavras do meu coração. Eu não tinha “know-how” nenhum para avaliar.


– Eu vou pro meu quarto descansar um pouco, se não se importa... Estou completamente exausto!

Naquele momento, minha alegria se aliou ao egoísmo de querer Pedro de volta ao meu lado, e ambos cegaram-me diante do real motivo de sua angústia. Era mais fácil aceitar sem questionamentos, do que admitir minha parcela de culpa.


Mal Pedro bateu a porta do quarto, meu iphone iniciou uma rumba que há pouco tempo eu havia escolhido para o número do Tatá.
– Oiê! – Atendi.


– Porque não está aqui no centro acadêmico, Léo? Faltou a aula de Sociologia, e a de Laboratório!
– Ai, Tatá! Libera meu anjo da guarda! Você também não!


– Eu também não o quê, Léo?! Eu não te entendo, sinceramente! Achei que estava tomando gosto por alguma coisa...
– Eu disse que ia trancar matéria, não disse?


– Mas até onde eu sei você não trancou! – Ele rangia os dentes, parecia não querer que mais ninguém participasse da conversa. – Então, o que está fazendo?
– Estava esperando meu irmão chegar. Não aguentava de ansiedade, Tatá! Não ia conseguir me concentrar em nada mesmo!


– Ansiosa? Por uma resposta que estava cansada de saber? Isso não é desculpa!
– Ele não passou, Tatá... – Eu disse resignada.


– Impossível, Léo! – Ele exclamou.
– To te dizendo! Mas por favor não comente nada! Eu não sei se ele já falou pra alguém... Ele tá tão arrasado!


– Ah... Claro que não vou falar nada... Eu só acho estranho... Eu entendo tanto de futebol quanto você, mas sou inteirado sobre qualquer assunto do Campus, né? Seu irmão é um dos melhores zagueiros de todos os tempos da UFEB. Ele é lenda nos corredores do estádio.
Nunca duvidei.
– Eu sei, Tadeu... Mas os caras devem ser imbecis! Como vou saber?


– Yuri me perguntou se eu sabia de alguma coisa, queria saber se estava tudo bem...
– O que é que você disse? – Eu já perguntei apreensiva. Tadeu também não costumava ter muita coerência ao falar com Yuri.


– Eita! Só disse que eu não sabia de nada, ué? O que é que eu teria pra dizer?! – Ele pareceu sentido.
– Desculpa, Tatá... Essa coisa do Pedro me deixou com os nervos a flor da pele.


– Vamos almoçar no Bumper?
Eu não estava com nenhuma paciência para a Augusta.
– Ah, nem rola... Vou comer alguma besteira aqui em casa mesmo... Depois acho que tenho algum trabalho pra fazer...


– Tem, Loira! De Citologia, esqueceu?
– Isso, Obrigada por lembrar! O que seria de mim sem você?


– É... Eu te digo isso sempre, mas você não dá valor! – Tadeu me provocou com seu drama básico. – Hey! Eu já terminei o meu, posso te ajudar se você quiser... Quer que eu passe aí?
– Ótima idéia!

Esse era o tipo de ajuda para o qual era impossível dizer não.


Tadeu veio, e praticamente fez meu trabalho sozinho. Para variar, eu mal sabia o que estava sendo tratado em sala, e nem tinha interesse em saber. Meu pensamento ia longe dali. Durante todo o tempo eu mantive a porta do meu quarto aberta, a fim de perceber qualquer movimento na casa.


E durante todo aquele mesmo tempo, a porta do quarto de meu irmão sequer se mexeu.



4 comentários:

  1. O que mais gostei neste capítulo foi do pensamento da Léo: "talvez nem Nicole fosse boa o suficiente para Pedro"
    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    Quem seria então?

    Mew! Sério... Quando um motoqueiro lindo daqueles vai parar na minha porta? .-.
    Acho que não vai ser mais nessa encarnação... Ç.Ç

    Esta volta de mãos abanando do Pedro é super suspeita, né?

    A Léo explora o Tatá, viu? rsrsrsrsrsrs
    O pior é que ele gosta!

    AMO!!!!
    bjosmil! *.*

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  2. heheheh, quem será? Será que ela existe? É paupável? ahsuhasuahs Léo complicadinha! Eu não sei, mas se parar na sua porta, pergunte se tem um irmão pra mim!!!!!!!!!!!! kkkkkkkkkkkkk

    Suspeitíssima... .lala.

    Gosta, não, ele ama! hasuhaushaush! XP

    Obrigada!!!!
    ..: Bjks :..

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  3. [AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA], por que o Pedro tem que chegar na hora que a Léo tá com o Nuno?! SEMPRE o Pedro tá lá, para, sei-lá-pra-quê!

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    1. Haushuahsuhsau, ela que só pensa no pedro o tempo todo, não? Hehehehe

      Bjks!

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